O amigo Paulo César Vasconcellos costuma dizer que o brasileiro vive numa eterna ponte aérea entre a euforia e a depressão. É o que se percebe a cinco dias da estreia do Brasil na Copa do Mundo, com enorme empolgação com as bolsas de apostas europeias apontando a seleção de Tite como favorita.
Um ano atrás, o olhar era bem diferente.
No dia 7 de outubro de 2021, a seleção ganhou de virada da Venezuela, por 3 a 1, em Caracas, com péssima atuação. Levou o primeiro gol, empatou com Marquinhos, de cabeça, aos 25 do segundo tempo, e só virou com Gabriel Jesus, de pênalti, faltando seis minutos para o apito final —o terceiro aconteceu aos 50 da segunda etapa.
Naquela mesma data, a França virou para 3 a 2 um jogo que perdia por 2 a 0 no intervalo, contra a Bélgica. A Liga das Nações expunha o abismo entre Europa e América do Sul. Nem Brasil nem Argentina teriam a menor chance na Copa, dizíamos.
Nem depressão nem euforia. Tite trabalha com realismo, que nos falta em boa parte das análises. O Brasil é candidato ao título, não é favorito. Há uma dúvida enorme sobre a capacidade de atuação contra europeus, depois de eliminações nas últimas quatro Copas contra seleções do velho continente –França, Holanda, Alemanha e Bélgica.
Depois da vitória na final de 2002, o Brasil enfrentou seleções da Europa dez vezes em Mundiais e ganhou três, duas contra a Croácia e uma da Sérvia. Empatou com Portugal e Suíça, perdeu a decisão de terceiro e quarto contra os holandeses, em Brasília, além das quatro eliminações.
Não é bom agouro enfrentar suíços e sérvios pela segunda Copa seguida, na fase de grupos. Incrível coincidência com o sorteio de 2018, e também de 1950, quando a seleção jogou de branco no empate contra a Suíça, no Pacaembu, e vitória sobre a Iugoslávia, no Maracanã.
Naquele tempo, também havia motivo para medo da Europa, porque as três primeiras quedas aconteceram para iugoslavos, em 1930, espanhóis, em 1934, e italianos, em 1938. Há duas diferenças daquele tempo para o atual futebol globalizado. A primeira é que brasileiro jogava contra brasileiro —e só.
A última Copa a que a seleção chegou sem ter feito amistosos contra europeus foi a de 1954, e não é coincidência ter vencido pela primeira vez depois da primeira excursão ao velho continente, em 1956. Aí vem a segunda dessemelhança: o Brasil não enfrenta a Europa, os jogadores brasileiros, sim.
Alguém vai dizer que Neymar, Vinicius Junior, Rodrygo, Raphinha, Paquetá e Richarlison não conhecem as características de zagueiros sérvios, suíços, portugueses, alemães, espanhóis e holandeses? Claro que conhecem.
O problema é ter de enfrentar todos esses, o que é uma perspectiva tenebrosa. O Brasil pode jogar contra Portugal, ou Uruguai, nas oitavas de final. Esperar Alemanha, ou Espanha, nas quartas. Jogar contra Holanda, ou Argentina, na semi. França, ou Inglaterra, na decisão.
Nunca houve um campeão que chegasse ao título cruzando apenas contra antigos campeões mundiais, em todos os mata-matas. O Brasil pode precisar disso, se enfrentar Uruguai, Alemanha, Argentina e França, por exemplo.
O caminho é muito duro e isso exige realismo. Nem a depressão de 7 de outubro do ano passado, em Caracas, nem a euforia das casas de apostas europeias.
Caminho do Brasil na Copa do Mundo é duro e exige realismo - UOL
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