Após a repercussão negativa causada por uma fala racista direcionada a Lewis Hamilton, o ex-F1 Nelson Piquet emitiu uma nota na qual pede desculpas ao heptacampeão, mas relativiza o termo "neguinho", que adotou para mencionar o britânico. Doutor em Direito e autor do livro "Racismo Recreativo", Adilson Moreira detalhou as problemáticas da expressão e da justificativa do três vezes campeão da categoria.
- Termos como "neguinho", "criolo", "negão" são utilizados em uma variedade de situações. Mas expressam estereótipos, representações negativas sobre pessoas negras. Elas reproduzem a ideia de que negros não são atores sociais competentes, são pessoas moralmente degradadas. Esse foi exatamente o sentido utilizado por Nelson Piquet quando fez referência a Lewis Hamilton - explica.
Nelson Piquet utilizou termo racista para falar de Lewis Hamilton em entrevista — Foto: Marcelo Casal Jr/Agência Brasil
Ao comentar sobre a batida do piloto da Mercedes com Max Verstappen - namorado da filha do tricampeão, Kelly - no GP da Inglaterra de 2021, Piquet citou duas vezes a expressão discriminatória. A Fórmula 1 e a Fórmula E, a Federação Internacional do Automobilismo (FIA) e a equipe de Hamilton emitiram notas condenando o caso.
- O "neguinho" meteu o carro e deixou. O Senna não fez isso. O Senna não fez isso. Ele foi, assim, "aqui eu arranco ele de qualquer maneira". O "neguinho" deixou o carro. É porque você não conhece a curva; é uma curva muito de alta, não tem jeito de passar dois carros e não tem jeito de passar do lado. Ele fez de sacanagem - disse o ex-piloto em entrevista.
As rivais Ferrari, McLaren, Alpine e Aston Martin, bem como o colega do heptacampeão George Russell e os pilotos Charles Leclerc, Carlos Sainz, Lando Norris, Daniel Ricciardo e Esteban Ocon também se posicionaram.
"O que eu disse foi mal pensado, e não defendo isso, mas vou esclarecer que o termo usado é aquele que tem sido amplamente e historicamente usado coloquialmente no português brasileiro como sinônimo de 'cara' ou 'pessoa' e nunca teve a intenção de ofender. Peço desculpas de todo o coração a todos que foram afetados, incluindo Lewis, que é um piloto incrível, mas a tradução em algumas mídias que agora circulam nas redes sociais não está correta. A discriminação não tem lugar na F1 ou na sociedade e estou feliz em esclarecer meus pensamentos a esse respeito", declarou Piquet, em nota oficial.
Lewis Hamilton e Max Verstappen bateram na segunda volta do GP da Inglaterra — Foto: AP Photo/Jon Super
Moreira explica o racismo como um mecanismo que segrega pessoas negras à margem da sociedade, e reforça que a linguagem é uma das ferramentas usadas para desqualificar um povo moralmente. Hamilton é o único negro do atual grid da F1 e o único com vitórias e títulos na história da categoria que já teve, em 2016 e 2017, o alemão Pascal Wehrlein - hoje na Fórmula E.
- Temos um homem branco que se refere a um colega de profissão de maneira pejorativa, quem muitas pessoas consideram como o maior piloto de Fórmula 1 de todos os tempos. E esse piloto não é branco, ele é negro. Isso tem uma conotação negativa porque é um homem branco tentando desqualificar moralmente uma pessoa negra, um mecanismo por meio do qual pessoas brancas tentam afirmar a superioridade moral por meio de um termo derrogatório - continua o doutor em Direito.
Lewis Hamilton, da Mercedes, protesta por morte de Breonna Taylor no GP da Toscana, em Mugello — Foto: Dan Istitene/Formula 1 via Getty Images
Recém-nomeado cidadão honorário do Brasil, o heptacampeão da Mercedes repostou um fã que questionou, de forma irônica, "quem é Nelson Piquet?". Depois, pediu por mudanças de mentalidade em português e finalizou as postagens cobrando por ações efetivas contra a discriminação no esporte.
- Quando você reproduz estereótipos negativos sobre mulheres, negros, homossexuais, nordestinos, pessoas pobres, você está legitimando práticas discriminatórias contra esses indivíduos. Nós precisamos, enquanto sociedade, ensinar o respeito desde a infância. Precisamos ensinar conceitos muito básicos para que, dessa forma, as pessoas possam ser criadas dentro de uma cultura democrática - recomenda Moreira.
O próprio episódio no Circuito de Silverstone, no ano passado, fez Hamilton ser alvo de ataques raciais na internet, amplamente repudiados pela F1, FIA, Mercedes e RBR, equipe de Verstappen.
O heptacampeão tem sido uma voz proeminente no combate ao racismo dentro da F1, fundando a instituição Mission 44 e promovendo iniciativas que visam aumentar a diversidade no esporte.
Infos e horários do GP da Inglaterra da F1 — Foto: Infoesporte
Doutor especialista no tema explica racismo em fala de Piquet sobre Hamilton - Globo
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